sexta-feira, 19 de setembro de 2014

Festival de intolerâncias


Estamos vivendo tempos complicados. O novo episódio envolvendo o goleiro Aranha e a torcida do Grêmio deflagrou uma onda de ódio e posições ferrenhas de parte a parte.

Há quem condene o goleiro por ter se sentido ofendido. Culpado por ter denunciado, ter reclamado que estava sofrendo com as claras injúrias raciais naquele 28 de agosto. Por outro lado, os gremistas estão carregando uma imagem racista, de um clube preconceituoso, assim como todo o povo gaúcho.

Tenho visto um festival de intolerâncias, uma incapacidade do ser humano em entender o outro, ausência total de compreensão, da liberdade do próximo, em todos os sentidos. Posso ser contraditório, mas, em meio à posições tão antagônicas, consegui não concordar com nada e fiquei decepcionado com todas as atitudes que vi. Saí da Arena do Grêmio triste, chateado mesmo.


Foi um jogo pesado, carregado, tenso. Um ambiente belicoso. Não culpo o torcedor pela vaia. Foram desproporcionais, é verdade, mas como esperar uma reação diferente de uma torcida que teve o seu clube excluído de uma competição pela primeira vez na história, por conta de meia dúzia de infelizes? Aranha não foi o culpado disso. Foi o pivô da punição, mas não o responsável, embora personagem dela. É complexo. Aranha fez o que tinha que fazer, mas ao taxar o clube todo de racista, provocou a revolta de um torcedor que se sentiu injustiçado, exatamente por não concordar com os atos racistas.

Aranha é vítima inegável do processo, mas não precisava se dirigir aos torcedores tricolores como “essa gente”. Foi corajoso ao encarar o estádio em apupos, jogar com frieza e ainda garantir o empate para o seu time. Ele não precisava ser tolerante, não se espera serenidade de quem se sente ultrajado. Não posso julgar alguém por algo que nunca passei. Mas penso que ele poderia ter a grandeza de entender que estava ali como adversário. A torcida o considera um algoz, mesmo que entenda o seu lado. A vaia é uma atitude democrática, existe para demonstrar inconformidade com alguma coisa, para desestabilizar o rival. Pode não ter sido esse o motivo de alguns, mas quero imaginar que tenha sido da maioria.

Aranha falou que esperava encontrar Patrícia Moreira, mas antes havia dito que não pretendia encontrá-la. Ele mesmo entendeu que a menina flagrada o chamando de macaco não quis cometer um crime. Errou como tantos outros, mas que não tiveram o linchamento virtual ou apedrejamento real que ela sofreu.



Estamos discutindo há dias o caso Patrícia/Aranha, como se fosse o único da face da Terra. Como se o racismo existisse apenas no Grêmio ou no Rio Grande do Sul. É um problema mundial, simplesmente porque é um problema da sociedade, do ser humano. O racismo é uma vertente do egoísmo imbecil, da mania de olharmos para nós mesmos, de nos preocuparmos com questões pequenas e que vão além da cor da pele. A discriminação está presente de várias maneiras e não vamos resolver o problema do mundo culpando Aranha, prendendo a Patrícia ou banindo pra sempre um clube do futebol. Temos que continuar lutando, mas o problema é macro. Estamos no micro.

Entre brancos e negros, o problema parece ser da raça humana.

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